terça-feira, 27 de outubro de 2015

ARTESANIAS - GAL MONTEIRO

Voz de Gal Monteiro

* Reprodução neste blog gentilmente autorizada pela autora

Sopro frio no fim da tarde
Cabelos são linhas assimétricas desenhando coisas na cara concentrada
A artesania dos ventos cria figuras distintas sobre o caldo da Mundaú
Uma mão de ternura esfrega o “mata-piolho” no “fura-bolo”
E eles se ocupam, se completam para o nó
e chamam o “maior de todos” para apertar o laceado.


E a mãe intima o moleque andejo,
E ele acode, vindo de perambulâncias inconfessadas, pelos arredores:
“Ô menino, aprega o quadro e me traz aqui!
Chegue, menino, demore não, que preciso
Armar o quadro e começar o caseado”.

E o “seu-vizinho” procura seu par
E convida o “mindinho” para ajudar a urdir
os fios de mil e uma cores.

E vai surgindo a nervura
E vai engrossando a textura
E vai se configurando um labirinto
No meio da renascença de vidas miúdas e serenas da beira d’água:
um ato de dessa fé.

E do outro lado, beirando o Velhinho a quem chamam de Chico
os viventes da Ilha do Ferro se dão boas-noites em muitos tons
E eles assustam forasteiros com os paus que viram bichos feios, carrancudos,
extraordinários.

E tem tanto pano bonito,
de não se querer usar pra não gastar
E eles se estendem terra adentro, água adentro
à guisa de DNA, como espelho-espelho-meu

Sento no banco torto, onde se escrevem histórias de vida
e me misturo às nervuras da trama:
feito linha e fita,
matame e chuleado
E eis que sou um deles, pendurada num varal, à venda...
Ei, moço, moça, me compra, me leva! 

 

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